quinta-feira, 7 de dezembro de 2017

Revérboro


Deitado sobre o colchão; ainda que sozinho, está debaixo da paz e o amor que ela lhe dá: as luzes,
as estrelas; a explosão de beija flor; mel no pote do enxame de abelhas; pisar na nuvem de algodão; 
sensações essas que lhe toma por companhia além do ar Caetâneado…
— Haaa como és forte, como és doce, como és meiga — proclama o ainda jovem poeta redescobrindo 
a sua nobre vocação de poetizar e transpor o ser humano e seus sentimentos para a eternidade do 
papel; estava diante da madame realização, essa também conhecida por rei de Salém.
— Mas por que demorou tanto, nobre senhora? — o poeta já não sabia se realizar sonhos era utopia de poucos ou só 
dos outros!
Essa madame de presença sedutora e fascinante, de alta nitescência, furor, revérbero — não obstante,
de fina etiqueta, via-se logo, e modo requintado recorda-lhe, num prazeroso sussurro, alguns livros que
o poeta lera ou até relera e que sentidos fizera porém ele esquecera.
O moço se explica: ele desejou; o poeta sonhou mas seu trem não vinha. Quantos outros passaram,
outros passageiros embarcaram para viverem as suas próprias lendas; todavia, para ele só havia aquela
chuva.
“Eu desisto” pensou o poeta numa ocasião de outrora.
“ela não está atrasada como eu pensei, visto que nada atrasa quando não tem a real intenção de vir” 
E quis mesmo largar a parada e até largou; mas, tempos depois, ela voltou dizendo o que já tinha avisado:
"sempre iria voltar até ser, finalmente, escutada."
Esse mote aborreceu o moço que indagou aos seus botões se o era motejo.
Como ela queria ter sido escutada se nunca, jamais, lhe falara depois da primeira e impactante vez ainda no 
começo da sua juventude?
— Sempre lhe falei — revelou a ataviada senhora — você me ouvia mas não me escutava! 
“Eu estava no trabalho; na Europa; na faculdade — o teu olho me olhava mas não me enxergava” — complementou
a dama e explicou:
“O trem, esse tipo de trem, não atrasa e nem demora; ele chega exatamente na hora que tem que 
chegar e é essencial, também, a sua sensibilidade para decodificar os sinais para nele embarcar.”
O poeta, encantado, compreendeu, desta feita, quais eram os sinais pois mesmo sem saber ele os 
reconhecera; a linguagem universal decifrou sem aperceber-se e, posto isto, teve a certeza que o seu desejo 
“nasceu na alma do universo” parafraseando os antigos livros que lera, porém esquecera.
— Eu não sei dizer se eu sou um homem que se fez poeta ou um poeta que se fez homem; é um dilema!
“será que primeiro vem a alma ou primeiro vem a lenda?
“Será que primeiro vem o homem ou primeiro vem o poeta? 
Ou a alma da lenda que se fez homem justamente para virar poeta ou o é homem poeta cuja a alma se faz lenda?”

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